domingo, 13 de dezembro de 2009

A averbação da reserva legal e da servidão florestal

INTRODUÇÃO

A reserva legal, instituída por ser necessária ao uso sustentável dos recursos naturais, à conservação e reabilitação dos processos ecológicos, à conservação da biodiversidade e ao abrigo e proteção de fauna e flora nativas, e as áreas de preservação permanente coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas, consideradas como limitação administrativa, têm como finalidade atender ao princípio da função social da propriedade.

Nas limitações administrativas à propriedade não se faz necessário levá-las à averbação junto ao Registro Imobiliário, por serem imposição legal, geral unilateral e gratuita. A própria lei lhes dá publicidade e eficácia necessárias para o seu cumprimento por todos.

A servidão florestal, apesar de não se constituir em limitação administrativa ou servidão administrativa, sendo, portanto, servidão regulada pela Lei Civil, busca atender ao princípio da função social da propriedade e de preservação do meio ambiente. Ao contrário das limitações administrativas, a servidão florestal não se presume, sendo necessária sua averbação no Registro Imobiliário.

A significação econômica, política e social destes institutos jurídicos derivam da preocupação com o desequilíbrio ecológico causado pela ação predatória ao meio ambiente, em função da influência exercida na estrutura das sociedades. Apesar da função social em se preservar o meio ambiente, devemos nos ater a boa aplicação da lei, através de uma interpretação serena e imparcial que é um dos pressupostos mais importantes para sustentar um Estado de Direito.


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1 – EVOLUÇÃO DAS RESTRIÇÕES DO ESTADO SOBRE A PROPRIEDADE PRIVADA

A propriedade como o mais amplo direito real, que congrega os poderes de usar, gozar e dispor da coisa, de forma absoluta e perpétua, bem como o de persegui-la nas mãos de quem quer que injustamente a detenha, e cujo desmembramento implica a constituição de direitos reais parciais, evoluiu no sentido individual para o social. A propriedade foi sendo afetada, principalmente a partir da segunda metade do século XIX, por crescente número de restrições impostas pelo Estado. (1)

Hoje, prevalece o princípio da função social da propriedade, que autoriza não apenas a imposição de obrigações de não fazer, como também as de deixar de fazer e, hoje, pela Constituição, a obrigação de fazer, expressa no art. 186, consistente na adequada aproveitamento do solo rural.


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2 – LIMITAÇÃO ADMINISTRATIVA

2.1 – Conceito e natureza jurídica

Para Hely Lopes Meirelles "limitação administrativa é toda imposição geral, gratuita, unilateral e de ordem pública condicionadora do exercício de direitos ou de atividades particulares às exigências do bem-estar social." As limitações administrativas são preceitos de ordem pública. Derivam, comumente, do poder de polícia inerente e indissociável da Administração e se exteriorizam em imposições unilaterais e imperativas, sob a tríplice modalidade positiva (fazer), negativa (não fazer) ou permissiva (deixar fazer). As limitações administrativas deverão corresponder às justas exigências do poder público que as motiva sem produzir um total aniquilamento da propriedade ou das atividades reguladas. (2)

As limitações administrativas só são legítimas quando representam razoáveis medidas de condicionamento do uso da propriedade, em benefício do bem-estar social (CF, art. 170, III), e não impedem a utilização da coisa segundo sua destinação natural. A limitação administrativa tem como característica a gratuidade e a generalidade da medida protetora dos interesses da comunidade.

As limitações administrativas tem natureza jurídica de ordem pública, são regidas pelo Direito Administrativo, diversamente das restrições civis, que permanecem reguladas pelo Direito Privado.


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3 – RESERVA LEGAL

3.1 – Conceito e natureza jurídica

O conceito de reserva legal é dado pelo Código Florestal, em seu art. 1°, §2°, III, inserido pela MP n°. 2.166-67, de 24.08.2001, sendo: "área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural, excetuada a de preservação permanente, necessária ao uso sustentável dos recursos naturais, à conservação e reabilitação dos processos ecológicos, à conservação da biodiversidade e ao abrigo e proteção de fauna e flora nativas."

A reserva legal é uma das modalidades de limitação administrativa, uma vez que foi instituída por lei – Código Florestal; imposta pelo Poder Público de forma unilateral, geral e gratuita sobre a propriedade ou posse rural.

Reconhece-se, desse modo, que a restrição em tela configura limitação administrativa e o principal efeito que daí decorre é o de que não enseja ela direito à indenização, ao contrário do que se passa com a servidão administrativa.

Dentre as limitações administrativas podemos citar as dos artigos 16 e 44 do Código Florestal, redação inserida pela MP n°. 2.166-67, de 24.08.2001.

3.2 – Finalidade e efeitos da averbação da reserva legal

A reserva legal, como limitação administrativa à propriedade, independe de averbação no Registro de Imóveis, uma vez que a sua publicidade é conferida pela Lei. Como limitação administrativa, o Código Florestal incide de forma geral, gratuita, unilateral condicionando e limitando o uso de parte certa e localizada de toda propriedade rural.

Surge a necessidade da especialização da Reserva Legal no Registro Imobiliário, quando existe a pretensão do proprietário em explorar o imóvel suprimindo vegetação nativa ou florestas já existentes.

A finalidade da averbação da Reserva Legal na matrícula do imóvel é a de dar publicidade à reserva legal, para que futuros adquirentes saibam onde está localizada, seus limites e confrontações, uma vez que podem ser demarcadas em qualquer lugar da propriedade. E a lei determina que, uma vez demarcada, fica vedada a alteração de sua destinação, inclusive nos casos de transmissão, a qualquer título, nos casos de desmembramento ou de retificação de área.

Portanto, a averbação da Reserva Florestal não é pré-requisito para o ingresso de qualquer título inter vivos ou causa mortis no Registro Imobiliário, nem o seu conseqüente lançamento em forma de registro ou averbação nas respectivas matrículas dos imóveis, podendo ser praticados os atos previstos no artigo 167 da Lei n. 6.015, de 31 de dezembro de 1973 (Registros Públicos), independentemente de nas matrículas dos imóveis constar a averbação da Reserva Legal.

A Reserva Legal é sim, pré-requisito para a exploração da Floresta ou outra forma de vegetação nativa existentes no imóvel rural, devendo, para isso, o seu titular averbá-la, com antecedência, junto à matrícula do imóvel no Registro de Imóveis da circunscrição respectiva, antes da supressão da mata.

3.3 – Requisitos para averbação da reserva legal.

Sendo necessária a delimitação da reserva legal para fins de supressão de floresta ou vegetação nativas existentes, deverá o interessado se dirigir ao IEF – Instituto Estadual de Florestas (no caso do Estado de Minas Gerais), munido com planta ou croquis da sua propriedade rural, e formar um processo de aprovação. O órgão ambiental, analisando com os critérios e instrumentos definidos em lei, depois de feita a vistoria na área a ser desmatada, localiza e define a Área da Reserva Legal na propriedade, emitindo um documento, chamado Termo de Preservação de Florestas. Nesse momento, o interessado ainda não pode fazer a supressão da mata. Com o Termo de Preservação de Florestas em mãos, o interessado se dirige ao Ofício de Registro Imobiliário da circunscrição do imóvel e solicita a sua averbação na respectiva matrícula. Só depois de feita a averbação, o interessado poderá promover a supressão da floresta ou outra forma de vegetação nativa existentes no imóvel e objeto da autorização.

A emissão do Termo de Preservação de Florestas, pelo órgão florestal, não dá eficácia à Reserva Legal. Só a averbação no Registro de Imóveis lhe dá a eficácia legal e autoriza a supressão da mata. A averbação da Reserva Legal tem como única finalidade autorizar o interessado a desmatar o imóvel, e não é empecilho para o exercício de outros direitos sobre a propriedade imobiliária.

Pelo §8°, do art. 16, do Código Florestal, verbis:

"§ 8º A área de reserva legal deve ser averbada à margem da inscrição de matrícula do imóvel, no registro de imóveis competente, sendo vedada a alteração de sua destinação, nos casos de transmissão, a qualquer título, de desmembramento ou de retificação da área, com as exceções previstas neste Código."

A interpretação isolada do disposto no § 8°, vem trazendo obstáculos nos registros de documentos, especialmente nas transmissões a serem registradas nos Cartórios de Registro de Imóveis.

3.4 – Exigências fiscais e tributárias para averbação da reserva legal

Para a delimitação de reserva legal o interessado deverá ir ao Órgão Florestal, sendo no Estado de Minas Gerais, o IEF – Instituto Estadual de Florestas, munido da Escritura Pública ou Registro de Propriedade do imóvel rural, em caso de só haver Contrato Particular de Compra e Venda, o mesmo deverá estar registrado no Registro Imobiliário.Deverá apresentar o Cartão de Produtor Rural, documentos pessoais (Carteira de Identidade e CPF).

O interessado poderá realizar a vistoria e delimitação da reserva legal através de Engenheiro do IEF, este serviço é cobrado segundo a Portaria 082/97, levando em consideração a área a ser demarcada e a distância entre a unidade executora e a propriedade rural, conforme a tabela, em UFIR, abaixo:

Área total da propriedade rural em hectares
Distância em quilometragem entre a Unidade Executora e a propriedade rural

Até 50 Km
Acima de 50 Km até 100 Km
Acima de 100 Km até 200 Km
Acima de 200 Km até 500 Km
Acima de 500 Km

Até 30 ha
96,68
146,17
276,85
562,20
1.000,16

Acima de 30ha até 100 ha
131,51
218,97
308,73
594,09
1.068,08

Acima de 100ha até 300 ha
215,05
264,67
357,35
642,70
1.113,66

Acima de 300ha até 500 ha
245,60
295,10
425,78
679,32
1.188,16

Acima de 500ha até 1000 ha
279,17
328,56
459,24
706,71
1.227,67

Acima de 1000 ha
371,74
412,24
514,04
761,51
1.359,74


O interessado também poderá apresentar ao IEF, segundo a Portaria 020/2002, mapas e laudos técnicos elaborados por profissional legalmente competente (engenheiros florestais, engenheiros agrônomos e outros que comprovem ter habilitação legal para a confecção dos instrumentos ora mencionados), não servidor do IEF, para definição das Reservas Legais de propriedades rurais. Neste caso o pagamento é realizado diretamente ao profissional habilitado, sem custas cobradas do IEF ao interessado.

Após a elaboração do Termo de Compromisso de Preservação de Florestas, o interessado deverá levá-lo acompanhado de planta topográfica ou croqui do imóvel ao Cartório de Registro de Imóveis competente para proceder a sua averbação. (PROVIMENTO Nº 092/GACOR/2003).

O Termo de Compromisso de Preservação de Florestas poderá ser substituído por documento emitido por órgão ambiental municipal ou outra instituição devidamente habilitada conveniada com o órgão ambiental estadual competente. (PROVIMENTO Nº 092/GACOR/2003).

Para a elaboração do Termo de Compromisso de Preservação de Florestas da pequena propriedade ou posse rural familiar deverá o Poder Público prestar apoio técnico e jurídico, quando necessário, nos termos do artigo 16, § 9º, da Lei Federal nº 4.771, 15/09/65, inserido pela MP n°. 2.166-67, de 24.08.2001.

Na posse, a reserva legal é assegurada por Termo de Ajustamento de Conduta, firmado pelo possuidor com o órgão ambiental estadual ou federal competente, com força de título executivo e contendo, no mínimo, a localização da reserva legal, as suas características ecológicas básicas e a proibição de supressão de sua vegetação, aplicando-se, no que couber, as mesmas disposições previstas neste Código para a propriedade rural, nos termos do artigo 16, § 10, da Lei Federal nº 4.771, 15/09/65, inserido pela MP n°. 2.166-67, de 24.08.2001.

Poderá ser instituída reserva legal em regime de condomínio entre mais de uma propriedade, respeitado o percentual legal em relação a cada imóvel, mediante a aprovação do órgão ambiental estadual competente e as devidas averbações referentes a todos os imóveis envolvidos, nos termos do artigo 16, § 11, da Lei Federal nº 4.771, 15/09/65, inserido pela MP n°. 2.166-67, de 24.08.2001.


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4 – ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE

4.1 – Conceito e natureza jurídica

Segundo o Código Florestal, tem-se por área de preservação permanente a "área protegida nos termos dos arts. 2º e 3º desta Lei, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas", conforme seu art. 1°, §2º, II, redação dada pela MP n°. 2.166-67, de 24.08.2001.

A área de preservação permanente é uma das modalidades de limitação administrativa, uma vez que foi instituída por lei – Código Florestal; imposta pelo Poder Público de forma unilateral, geral e gratuita sobre a propriedade ou posse rural.

Dentre as limitações administrativas podemos citar as dos artigos 2º, 3°, 8°, 18, 26, alíneas ‘a’, ‘b’, ‘c’, ‘o’, 31, alínea ‘b’, do Código Florestal, e art. 4°, com redação inserida pela MP n°. 2.166-67, de 24.08.2001. Conforme os arts. 2° e 3° do Código Florestal, consideram-se de preservação permanente, verbis;

Art. 2° Consideram-se de preservação permanente, pelo só efeito desta Lei, as florestas e demais formas de vegetação natural situadas:

a) ao longo dos rios ou de outro qualquer curso d´´água, em faixa marginal cuja largura mínima será:

1 - de 5 (cinco) metros para os rios de menos de 10 (dez) metros de largura:

2 - igual à metade da largura dos cursos que meçam de 10 (dez) a 200 (duzentos) metros de distancia entre as margens;

3 - de 100 (cem) metros para todos os cursos cuja largura seja superior a 200 (duzentos) metros.

b) ao redor das lagoas, lagos ou reservatórios d´´água naturais ou artificiais;

c) nas nascentes, mesmo nos chamados "olhos d´´água", seja qual for a sua situação topográfica;

d) no topo de morros, montes, montanhas e serras;

e) nas encostas ou partes destas, com declividade superior a 45°, equivalente a 100% na linha de maior declive;

f) nas restingas, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues;

g) nas bordas dos taboleiros ou chapadas;

h) em altitude superior a 1.800 (mil e oitocentos) metros, nos campos naturais ou artificiais, as florestas nativas e as vegetações campestres.

Art. 3º Consideram-se, ainda, de preservação permanentes, quando assim declaradas por ato do Poder Público, as florestas e demais formas de vegetação natural destinadas:

a) a atenuar a erosão das terras;

b) a fixar as dunas;

c) a formar faixas de proteção ao longo de rodovias e ferrovias;

d) a auxiliar a defesa do território nacional a critério das autoridades militares;

e) a proteger sítios de excepcional beleza ou de valor científico ou histórico;

f) a asilar exemplares da fauna ou flora ameaçados de extinção;

g) a manter o ambiente necessário à vida das populações silvícolas;

h) a assegurar condições de bem-estar público.

4.2 – Desnecessidade de averbação das áreas de preservação permanente

As limitações administrativas não são levadas aos Registros Imobiliários para a averbação junto às matrículas dos imóveis. É desnecessário. A lei lhes dá a publicidade e a eficácia necessárias para o seu cumprimento por todos.

O Poder Público fiscaliza o cumprimento da limitação administrativa, em decorrência do Poder de Polícia que lhe garantem os Direitos Administrativo e Constitucional, e não pela averbação de uma limitação administrativa nos Ofícios de Registro Imobiliário.

Às mesmas regras e fundamentos das limitações administrativas se submetem as Áreas de Preservação Permanente e de Reserva Legal, impostas aos proprietários rurais pelas leis ambientais, pois estas são limitações administrativas.

As Áreas de Preservação Permanente existem independentemente do seu registro ou averbação no Registro de Imóveis, e o proprietário do imóvel deve respeitá-las, na forma e nos limites que a lei estabelecer.

4.3 – Exigências fiscais e tributárias para averbação da área de preservação permanente

O interessado poderá realizar a laudo de perícia técnica e delimitação da área de preservação permanente através de Engenheiro do IEF, este serviço é cobrado segundo a Portaria 142/2001, levando em consideração a área a ser demarcada e a distância entre a unidade executora e a propriedade rural, conforme arts. 1° e 2°, verbis:

Art. 1º - Estabelecer tabela única para cobrança de perícia técnica ou estudo similar em caráter de prestação de serviços, quando solicitadas por terceiros, a qualquer título.

Art. 2º - Fica fixado, para as atividades descritas no artigo anterior, o preço de R$ 0,64 (sessenta e quatro centavos de real) por quilometro rodado e R$ 12,42 (doze reais e quarenta e dois centavos) por hora de trabalho, inclusive deslocamento.

Parágrafo único - Nos municípios onde não exista escritório do IEF, o quilômetro rodado e o tempo gasto para a realização da perícia técnica, só serão computados a partir da saída da sede do município, onde a propriedade estiver inserida, até a área a ser vistoriada, computando-se ida e volta.

O interessado também poderá apresentar ao IEF, segundo a Portaria 020/2002, mapas e laudos técnicos elaborados por profissional legalmente competente (engenheiros florestais, engenheiros agrônomos e outros que comprovem ter habilitação legal para a confecção dos instrumentos ora mencionados), não servidor do IEF, para definição das Áreas de Preservação Permanente. Neste caso o pagamento é realizado diretamente ao profissional habilitado, sem custas cobradas do IEF ao interessado.

Após a elaboração do laudo de perícia técnica com a aprovação do IEF, o interessado deverá levá-lo acompanhado de planta topográfica ou croqui do imóvel ao Cartório de Registro de Imóveis competente para proceder a sua averbação.


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5 – SERVIDÃO FLORESTAL

5.1 – Conceito e natureza jurídica

Conforme redação dada pela MP n°. 2.166-67, de 24.08.2001, que acrescentou o art. 44-A, ao Código Florestal, verbis: "O proprietário rural poderá instituir servidão florestal, mediante a qual voluntariamente renuncia, em caráter permanente ou temporário, a direitos de supressão ou exploração da vegetação nativa, localizada fora da reserva legal e da área com vegetação de preservação permanente."

A servidão florestal é o mecanismo que permite ao proprietário de imóvel rural com Título de Domínio oferecer parte de sua fazenda para figurar como reserva legal de terceiros, desde que esteja localizada na mesma bacia hidrográfica, que prevê que o dono de uma área poderá emitir certificado e negociar um valor com os interessados em preservá-la a fim de compensar a destruição de reserva legal nas terras.

Como estabelecido no Código Florestal, verbis:

Art. 44. O proprietário ou possuidor de imóvel rural com área de floresta nativa, natural, primitiva ou regenerada ou outra forma de vegetação nativa em extensão inferior ao estabelecido nos incisos I, II, III e IV do art. 16, ressalvado o disposto nos seus §§ 5º e 6º, deve adotar as seguintes alternativas, isoladas ou conjuntamente:

III - compensar a reserva legal por outra área equivalente em importância ecológica e extensão, desde que pertença ao mesmo ecossistema e esteja localizada na mesma microbacia, conforme critérios estabelecidos em regulamento.

§ 5º A compensação de que trata o inciso III deste artigo, deverá ser submetida à aprovação pelo órgão ambiental estadual competente, e pode ser implementada mediante o arrendamento de área sob regime de servidão florestal ou reserva legal, ou aquisição de cotas de que trata o art. 44-B.

Art. 44-B. Fica instituída a Cota de Reserva Florestal - CRF, título representativo de vegetação nativa sob regime de servidão florestal, de Reserva Particular do Patrimônio Natural ou reserva legal instituída voluntariamente sobre a vegetação que exceder os percentuais estabelecidos no art. 16 deste Código.

Parágrafo único. A regulamentação deste Código disporá sobre as características, natureza e prazo de validade do título de que trata este artigo, assim como os mecanismos que assegurem ao seu adquirente a existência e a conservação da vegetação objeto do título.

Art. 44-C. O proprietário ou possuidor que, a partir da vigência da Medida Provisória nº 1.736-31, de 14 de dezembro de 1998, suprimiu, total ou parcialmente florestas ou demais formas de vegetação nativa, situadas no interior de sua propriedade ou posse, sem as devidas autorizações exigidas por Lei, não pode fazer uso dos benefícios previstos no inciso III do art. 44.

A servidão florestal pode ser configurada como uma servidão regulada pelo Código Civil, em seu art. 1.378, não confundindo-se com o instituto jurídico da servidão administrativa e o da limitação administrativa, como poderemos demonstrar adiante.

Elementos comuns em qualquer tipo de servidão, segundo Maria Sylvia Zanella Di Pietro:

1 – a natureza de direito real sobre coisa alheia, no qual alguns dos poderes do domínio se destacam e se transferem a terceiros;

2 – a situação de sujeição em que se encontra a coisa serviente em relação à coisa dominante;

3 – o conteúdo da servidão é sempre uma utilidade inerente à res serviens e que dá ao titular do direito real o direito de usar, ou de gozar ou, ainda, o de extrair determinados produtos.

São princípios que regem a servidão de direito privado e aplicáveis também à servidão administrativa: o de que a servidão não se presume; o da indivisibilidade; o do uso moderado; o de que a servidão não se institui sobre coisa própria.

As servidões civis não impõem ao proprietário nenhuma obrigação de fazer, mas apenas a obrigação passiva de deixar fazer; ao contrário, certo número de servidões administrativas traduzem-se por obrigações positivas. As servidões administrativas, estando fora do comércio, não se extinguem pela prescrição, como as civis. As servidões administrativas podem gravar bens do domínio público, as civis não; as servidões administrativas não obrigam, em regra, à indenização, salvo quando esta é formalmente estabelecida em lei.

A servidão administrativa dentro do regime jurídico de direito público a que se submete, constitui uma prerrogativa da Administração Pública agindo com o poder de império que lhe permite onerar a propriedade privada com um direito real de natureza pública, sem obter previamente o consentimento do particular ou título expedido pelo Judiciário.

A servidão florestal também não pode se confundir com limitação administrativa, uma vez que sua constituição é voluntária, e sobre imóvel específico, nas limitações administrativas à propriedade deverá sempre existir um interesse público genérico e abstrato incidente sobre propriedades indeterminadas, e decorrentes de lei expressa.

5.2 – Finalidade e efeitos do registro da servidão florestal

A servidão florestal por ser de constituição voluntária, sobre imóvel específico, impondo-se uma obrigação passiva ao proprietário de não fazer, como natureza de direito real sobre coisa alheia, no qual alguns dos poderes do domínio se destacam e se transferem a terceiros e mantendo uma situação de sujeição em que se encontra a coisa serviente em relação à coisa dominante, não se pode presumir.

Para que se constitua a servidão florestal é necessário o seu registro no Cartório de Registro de Imóveis competente.

5.3 – Exigências fiscais e tributárias para o registro da servidão florestal

O interessado poderá realizar a laudo de perícia técnica e delimitação da área que pretende instituir servidão florestal através de Engenheiro do IEF, este serviço é cobrado segundo a Portaria 142/2001, levando em consideração a área a ser demarcada e a distância entre a unidade executora e a propriedade rural, conforme arts. 1° e 2°, verbis:

Art. 1º - Estabelecer tabela única para cobrança de perícia técnica ou estudo similar em caráter de prestação de serviços, quando solicitadas por terceiros, a qualquer título.

Art. 2º - Fica fixado, para as atividades descritas no artigo anterior, o preço de R$ 0,64 (sessenta e quatro centavos de real) por quilometro rodado e R$ 12,42 (doze reais e quarenta e dois centavos) por hora de trabalho, inclusive deslocamento.

Parágrafo único - Nos municípios onde não exista escritório do IEF, o quilômetro rodado e o tempo gasto para a realização da perícia técnica, só serão computados a partir da saída da sede do município, onde a propriedade estiver inserida, até a área a ser vistoriada, computando-se ida e volta.

O interessado também poderá apresentar ao IEF, segundo a Portaria 020/2002, mapas e laudos técnicos elaborados por profissional legalmente competente (engenheiros florestais, engenheiros agrônomos e outros que comprovem ter habilitação legal para a confecção dos instrumentos ora mencionados), não servidor do IEF, para definição da área que pretende instituir servidão florestal. Neste caso o pagamento é realizado diretamente ao profissional habilitado, sem custas cobradas do IEF ao interessado.

Após a elaboração do laudo de perícia técnica com a aprovação do IEF, o interessado deverá levá-lo acompanhado de planta topográfica ou croqui do imóvel, juntamente com a Escritura Pública, Contrato ou Testamento que instituiu a servidão florestal, ao Cartório de Registro de Imóveis competente para proceder ao registro.

A servidão florestal pode ser instituída por Escritura Pública, Contrato ou Testamento.

5.4 – Críticas ao instituto da servidão florestal

A aprovação da proposta para ampliação da Servidão Florestal é uma inovação, que foi submetida ao CONAMA – Conselho nacional do Meio Ambiente, antes de ser encaminhada ao Congresso Nacional. O excedente da reserva legal pode ser oferecido a outras pessoas, podendo também até ser cobrado taxa de condomínio, e ainda será contemplado com a isenção do Imposto Territorial Rural (ITR), referente ao terreno reservado para a Servidão Florestal e a outra inovação é a Cota de Reserva Florestal é quando o proprietário rural poderá, sobre uma área de matas existentes fora da Reserva Legal e das Áreas de Preservação Permanente, emitir títulos representativos da vegetação, que poderão ser negociados com outros proprietários que não tenham Reserva Legal integral ou no próprio mercado, com interessados que necessitem de certificações ambientais, por outros motivos.

Uma das críticas ao art. 44-C do Código Florestal é a da criação do mercado de títulos de servidão florestal sem quaisquer preocupações com a biodiversidade ao permitir que um proprietário compense o desmatamento realizado em sua propriedade ao comprar títulos de servidão florestal referente a outra propriedade denominados Cota de Reserva Flrorestal – CRF e Cota de Arrendamento de Reserva Florestal – CARF. Outra crítica é a transformação do IBAMA e dos órgãos ambientais estaduais em agentes reguladores do mercado de títulos de servidão florestal ao autorizá-los emitir Cotas de Reservas Florestais - CRF a título de "viabilizar a aquisição ou regularização de áreas de unidades de conservação"(art.7º).


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6 – CONCLUSÕES

A Constituição de 1988, ao repetir que a propriedade tem função social, não ficou apenas na regra programática. O constituinte foi mais específico e traçou alguns deveres do proprietário urbano e rural, exigindo dele também atividades. Quer dizer, para atender à função social, o proprietário tem de agir; já não lhe basta respeitar o direito do vizinho ou da comunidade.

A Constituição estabelece:

Art. 186. A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos:

I – aproveitamento racional e adequado;

II – utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;

III – observância das disposições que regulam as relações de trabalho;

IV – exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.

A Constituição em seu art. 225, preceitua, verbis: "Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida." E cabe ao Poder Público proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção das espécies ou submetam os animais a crueldade (inc. VII do mesmo artigo).

A limitação ao uso da propriedade rural está disciplinado pela própria Constituição Federal, pelo Código Florestal e Código Florestal Estadual, pela MP 2.166-67, de 24 de agosto de 2001, por portarias do IEF e demais legislações ambientais.


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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 9ª. ed., São Paulo: Malheiros, 1997.

CARVALHO, Afrânio de. Registro de imóveis. 4ª. ed., Rio de Janeiro: Forense, 2001.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 8ª. ed., São Paulo: Atlas, 1997.

DINIZ, Maria Helena. Sistema de registro de imóveis. 4ª. ed., São Paulo: Saraiva, 2003.

GRELHA VIEIRA, Fernando. A reserva legal como condição de exploração das florestas privadas. Revista dos Tribunais n°. 701, março 1994.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 22ª. ed., São Paulo: Malheiros, 1997.

MUSETTI, Rodrigo Andreotti. Do critério da autoridade competente na averbação da reserva legal. O neófito (Artigos).

ORLANDI NETO, Narciso. Reservas florestais. Revista do Instituto de Direito Imobiliário do Brasil - IRIB, n. 42, set./dez. 1997.

SANTOS, Francisco José Rezende dos. Áreas de preservação permanente e áreas de reserva legal. Trabalho apresentado no 10º Encontro de Notários e Registradores do Estado de Minas Gerais.

REALE, Miguel. Parecer à Sociedade Rural Brasileira. O Estado de S. Paulo, 15 de maio de 1999 (Resumo).
Postado por Sancho Neto

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Campanha Nacional de Comunicação da Anoreg-BR...

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Anúncio publicado pela Revista Época, na edição do dia 28/09/2009.



Fonte: Arpen Brasil


Postado por Sancho Neto

Uma abordagem sobre o usufruto de bem imóvel








Fabrício Petinelli Vieira Coutinho,

Resumo: Análise sistemática do direito real de usufruto que recai sobre bens imóveis, a começar pela compreensão dos atributos da propriedade que o constituem, as formas e o momento de sua constituição, o aspecto tributário, as formas de extinção e, ainda, a relevância da legislação registral imobiliária aplicada ao referido direito.

A compreensão do direito real de usufruto e seus efeitos depende do conhecimento dos atributos do direito real de propriedade, uma das maiores garantias constitucionais. Pelo teor do artigo 1.228 do Código Civil “o proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha”. Desta forma, entende-se que a propriedade é composta pelos descritos atributos, quais sejam, os direitos de usar (jus utendi), gozar ou fruir (jus fruendi), dispor (jus abutendi) e reivindicar.

O jus utendi permite retirar da coisa o proveito econômico que ela possa dar sem interposta pessoa. A utilização do imóvel para moradia do proprietário é um exemplo do direito de uso. Por seu turno, o jus fruendi pressupõe o direito de colher os frutos que a coisa possa gerar, como ocorrer com a colheita de frutas e rendimentos dos aluguéis. O jus abutendi representa a garantia de retirada do imóvel da esfera patrimonial dos proprietários, por alienação (compra e venda, p. ex.) ou mesmo por abandono. Por último, a reivindicação ou direito de sequela permite recobrar a coisa de quem a injustamente a possua ou detenha, bem a dar a finalidade pretendida para a coisa.

O usufruto, então, representa o exercício simultâneo de dois atributos da propriedade, os direitos de usar e fruir. Deste modo, conceitua-se como o direito real de uso e fruição sobre coisa alheia que atribui ao titular, denominado de usufrutuário, temporariamente, o direito de usar e fruir do bem móvel, imóvel ou universalidades pertencentes ao nu-proprietário. Assim, é possível compreender que o usufruto limita, mas não afasta o direito de propriedade. No mesmo sentido, a autora Maria Helena Diniz disserta que “perde o proprietário do bem o jus utendi e o fruendi, que são poderes inerentes ao domínio, porém não perde a substância, o conteúdo de seu direito de propriedade, que lhe fica na nua-propriedade”. O presente direito real está regulado no Código Civil de 2002 entre os artigos 1390 e 1411.

O usufruto pode ser constituído pela lei, por ato inter vivos (contrato, p. ex.), por ato causa mortis (testamento), por doação e por usucapião. É cabível o usufruto simultâneo, ou seja, duas ou mais pessoas exercerem o referido direito ao mesmo tempo. Entretanto, não pode haver usufruto sucessivo, tendo em vista se tratar de direito personalíssimo, portanto, intransmissível com a ocorrência do evento morte. O registro do usufruto na serventia imobiliária encontra base legal no artigo 167, inciso I, item 7, da Lei Federal 6.015/73, sendo lançado no Livro 2 – registro geral.

O Código Civil também estatui em seu artigo 1.391 que “o usufruto de imóveis, quando não resulte de usucapião, constituir-se-á mediante registro no Cartório de Registro de Imóveis”. A exceção ao usucapião se dá por que, neste caso, a constituição do usufruto ocorrerá com o trânsito em julgado da sentença declaratória de usucapião, a qual servirá de título para fins de registro imobiliário. Em complemento, Nicolau Balbino Filho ensina que “é sumariamente importante deixar claro que o usufruto constituído pela usucapião não depende do registro para confirmar sua legitimidade erga omnes. Mas para poder aliená-lo ao proprietário da coisa, com o objetivo de tornar plena a propriedade, em obediência ao princípio da continuidade registrária, ele não escapa à pré-inscrição, ou seja, ao registro propriamente dito”.

Como dito acima, é possível a existência de co-usufruto. Contudo, caso algum co-usufrutuário falte, por morte ou renúncia, o que ocorre com a sua parte? Nesta hipótese, surge o instituto do direito de acrescer que atribui a parte do indivíduo faltante ao co-usufrutuário remanescente. Em outras palavras, se A e B eram usufrutuários conjuntos, depois da morte de um deles, o outro poderá agregar o direito de usufruto do falecido. Todavia, só há que se falar em direito de acrescer no usufruto quando o instituidor ou reservante expressamente previr o referido direito no título que constituir o usufruto. Deste modo, a possibilidade de acréscimo deve ser expressa, na forma do artigo 1.411 do Código Civil, o qual prescreve que “constituído o usufruto em favor de duas ou mais pessoas, extinguir-se-á a parte em relação a cada uma das que falecerem, salvo se, por estipulação expressa, o quinhão desses couber ao sobrevivente”.

O poder de alienar é conditio sine qua non para a constituição do usufruto e de qualquer outro direito real. Logo, a instituição de usufruto, que opera a favor de terceiro, somente poderá ocorrer enquanto o instituidor for titular do domínio. O mesmo vale para a reserva de usufruto, pois esta deve ser efetivada antes da transmissão da nua-propriedade do imóvel. Para elucidar a matéria, tomemos os seguintes exemplos:

a) Doação com reserva de usufruto: A e B são proprietários de um imóvel e resolvem doar a nua-propriedade do mesmo ao filho C, reservando para si o usufruto vitalício. Apresentada a escritura no Registro Imobiliário, é tecnicamente correto registrar a reserva de usufruto antes do registro da doação da nua-propriedade. Ora, se a constituição do usufruto depende do poder de alienação, impossível será proceder à reserva após a doação da nua-propriedade, ocasião em que os doadores não mais terão o imóvel na sua esfera patrimonial. Contudo, há na doutrina uma discussão pertinente quanto ao registro da reserva de usufruto. Se antes do referido ato os reservantes já eram titulares do direito de uso e gozo, é dispensável o registro daquilo que foi constituído na aquisição da propriedade plena.

b) Compra e venda/doação de nua-propriedade e instituição de usufruto pelos vendedores/doadores: A e B são proprietários de um imóvel. Resolvem vender/doar a nua propriedade a C e instituir o usufruto vitalício em favor do filho D. Como a instituição depende do poder de alienar, necessário será formalizar o registro da instituição do usufruto para, em seguida, efetuar o registro da compra e venda/doação da nua-propriedade;

c) Compra e venda de nua-propriedade e instituição de usufruto pelo comprador: A e B são proprietários de um imóvel. Resolvem vender o imóvel a C que, por sua vez, institui o usufruto vitalício em favor de D. A lógica registral é distinta dos exemplos anteriores, pois o instituidor é o próprio comprador. Desta forma, C deverá adquirir o imóvel a fim de obter o poder de alienação para depois instituir o usufruto. Assim, os atos serão os seguintes: registro da compra e venda da propriedade plena seguido do registro da instituição do usufruto em favor de D.

Dentre outros caracteres, o usufruto é revestido da intransmissibilidade, por disposição expressa do artigo 1.393 do Código Civil vigente. A referida norma versa que “não se pode transferir o usufruto por alienação; mas o seu exercício pode ceder-se por título gratuito ou oneroso”. Contudo, é viável a alienação do usufruto ao proprietário da coisa resolúvel, tornando plena a propriedade. Tal transformação ocasiona a denominada consolidação que constitui forma legal de extinção do usufruto.

Como explanado acima, o usufruto registrado no fólio real pode ser constituído por ato inter vivos, causa mortis ou, ainda, doação. Desta forma, o tributo incidente dependerá da natureza do ato. Se a manifestação de vontade ocorrer por ato oneroso (inter vivos) deverá ser recolhimento o Imposto de Transmissão sobre bens imóvel por Ato Oneroso Inter Vivos - ITBI, cuja instituição é de competência municipal. Por outro lado, sendo a constituição por ato gratuito ou não oneroso (testamento ou doação), incide o Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação - ITCD, de natureza estadual.

As formas de extinção do usufruto estão previstas no artigo 1.410 do Código Civil, a saber:

I - pela renúncia ou morte do usufrutuário;

II - pelo termo de sua duração;

III - pela extinção da pessoa jurídica, em favor de quem o usufruto foi constituído, ou, se ela perdurar, pelo decurso de trinta anos da data em que se começou a exercer;

IV - pela cessação do motivo de que se origina;

V - pela destruição da coisa, guardadas as disposições dos arts. 1.407, 1.408, 2ª parte, e 1.409;

VI - pela consolidação;

VII - por culpa do usufrutuário, quando aliena, deteriora, ou deixa arruinar os bens, não lhes acudindo com os reparos de conservação, ou quando, no usufruto de títulos de crédito, não dá às importâncias recebidas a aplicação prevista no parágrafo único do art. 1.395;

VIII - Pelo não uso, ou não fruição, da coisa em que o usufruto recai (arts. 1.390 e 1.399).

Embora não conste no rol do referido artigo, a desapropriação também constitui forma de extinção do usufruto. Lado outro, o usufruto sobre bens de menor termina com a extinção do poder familiar, quando o menor atinge a maioridade legal.

A extinção do usufruto por si só não encerra os efeitos jurídicos deste direito no Cartório de Registro de Imóveis. Neste sentido, o artigo 252 da Lei Federal 6.015/73 regulamenta que “o registro, enquanto não cancelado, produz todos os efeitos legais ainda que, por outra maneira, se prove que o título está desfeito, anulado, extinto ou rescindido”. Frise-se então que, sempre que ocorrer alguma hipótese de extinção do direito real de usufruto, como morte ou renúncia, é indispensável proceder ao cancelamento do usufruto no fólio real, por averbação.

Com grande repercussão no mercado imobiliário, o usufruto de bem imóvel é um dos mais comuns direitos reais. Concluindo, o objetivo desta pesquisa foi demonstrar, além do aspecto conceitual e doutrinário do referido instituto, os efeitos percebidos pelo ingresso do título que formaliza o usufruto no Serviço de Registro Imobiliário, não apenas em relação aos sujeitos que participam do ato, mas também em relação a terceiros.

Referências bibliográficas
CENEVIVA, Walter. Lei de registros públicos comentada. 15ª ed. São Paulo: Saraiva, 2002.
DINIZ, Maria Helena. Sistemas de Registros de Imóveis. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
FILHO, Nicolau Balbino. Registro de Imóveis. 14ª ed. São Paulo: Saraiva.
JÚNIOR, Regnoberto M. de Melo. Lei de Registros Públicos comentada. Rio de Janeiro: Freitas Bastos Editora, 2003.
VADE MECUM SARAIVA. 7ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

Informações Bibliográficas

PETINELLI VIEIRA COUTINHO, Fabrício. Uma abordagem sobre o usufruto de bem imóvel. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, 64, 01/05/2009 [Internet].
Disponível em http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=6209. Acesso em 25/11/2009

Postado por Sancho Neto

Patrimônio de afetação: uma inovação no mercado imobiliário














Fabrício Petinelli Vieira Coutinho,

Resumo: O artigo jurídico aborda o patrimônio de afetação, garantia vinculada ao regime de incorporação imobiliária regulado pela Lei 4.591/64, descrevendo o contexto histórico que levou a sua regulamentação pelo legislador, as vantagens auferidas ao consumidor e ao incorporador, as formalidades para a sua instituição e a crítica ao texto normativo.

O direito de propriedade é historicamente reconhecido como umas das garantias de maior proteção do Estado e com as transformações do mundo moderno há uma constante necessidade de adequação das normas jurídicas para acompanhar tal processo de forma dinâmica. O atual boom do mercado imobiliário brasileiro verificado pelo maciço lançamento de empreendimentos de construção civil e a consolidação deste setor como um dos que disponibilizam o maior número de vagas no mercado de trabalho são reflexos deste processo de mudança. No entanto, esta aceleração também trouxe conseqüências negativas, sendo o acontecimento mais marcante a falência da ENCOL na década de 90, até então, uma das maiores construtoras do Brasil, que acabou com o sonho de milhares de famílias de constituir a casa própria.

A comercialização de unidades autônomas submetidas ao regime condominial, tais como apartamentos, lojas, salas, vagas de garagem, entre outros, na planta ou em construção, está amparada pela Lei 4.591 de 1.964. Este processo, denominado incorporação imobiliária, está definido no artigo 28, parágrafo único, do referido diploma legal, como a atividade exercida com o intuito de promover e realizar a construção, para alienação total ou parcial, de edificações ou conjunto de edificações compostas de unidades autônomas.

A veiculação do empreendimento imobiliário nos meios de imprensa e a venda das unidades autônomas dependem de prévio registro do memorial de incorporação imobiliária no fólio real. Para tanto, a mencionada lei estabelece, em seu artigo 32, uma série de exigências documentais, a fim de demonstrar não apenas a legitimidade do incorporador, pessoa física ou jurídica, para execução do empreendimento, mas também, a sua saúde financeira e as características da futura edificação. Contudo, para contornar os recentes episódios de quebra das incorporadoras, que criou um ambiente de insegurança jurídica para os consumidores, houve a necessidade de concepção de novos instrumentos jurídicos. Neste contexto, surgiu o patrimônio de afetação.

A primeira norma a versar sobre o patrimônio de afetação foi a Medida Provisória de nº. 2.221, de 04 de setembro de 2001. Posteriormente, a Lei Federal 10.931, publicada no dia 03 de agosto de 2004, introduziu o referido instituto na Lei Federal 4.591/64. Por patrimônio de afetação, entende-se o regime pelo qual o terreno e as acessões objeto da incorporação imobiliária, bem como demais bens e direitos a ela vinculados, mantêm-se separados, apartados do patrimônio do incorporador. Por conseqüência, o adquirente detém maior segurança jurídica no negócio, haja vista que o imóvel não se comunica com as demais obrigações, bens e direitos do incorporador, inclusive na hipótese de falência deste. Em outros termos, o imóvel ficará adstrito às dívidas e obrigações contraídas em razão da execução do empreendimento. Excepcionam-se, os recursos financeiros que excederem a importância necessária à conclusão da obra e o valor referente ao preço de alienação da fração ideal de terreno de cada unidade vendida, no caso de incorporação em que a construção seja contratada sob o regime por empreitada ou por administração, que, neste caso, não integram o patrimônio de afetação, ficando excluídos dele.

Os bens e direitos integrantes do patrimônio de afetação poderão ser objetos de garantias reais, como hipoteca ou alienação fiduciária, todavia o benefício deverá ser revertido integralmente em prol do respectivo empreendimento. Por outro lado, os recursos necessários à execução do empreendimento objeto do patrimônio de afetação deverão ser mantidos em conta de depósito, a ser aberta especificamente para o referido empreendimento.

Outro importante detalhe é que o patrimônio de afetação não é uma exclusividade dos imóveis submetidos ao processo de incorporação imobiliária. O autor Mario Pazutti Mezzari, em sua obra Condomínio e Incorporação no Registro de Imóveis, disserta que “nos casos em que não há a exigibilidade de registro da incorporação imobiliária, como acontece com os chamados grupos fechados, também se poderá instituir patrimônio de afetação, em qualquer fase da construção, mediante o registro da instituição de condomínio”.

A constituição do regime de afetação sobre o imóvel objeto da incorporação imobiliária se dá mediante averbação, a qualquer tempo, no Registro de Imóveis, de termo firmado pelo incorporador e, quando for o caso, também pelos titulares de direitos reais de aquisição sobre o terreno. De tal modo, é importante observar que o patrimônio de afetação deve ser lançado à margem da matrícula do imóvel em ato distinto e posterior ao que originou o registro da incorporação imobiliária.

O patrimônio de afetação também se constitui como um importante recurso de mídia, pois além de configurar uma garantia jurídica ao adquirente da fração ideal correspondente à unidade autônoma futura, pode ser indício da nobre intenção do incorporador em concretizar um negócio lícito e com garantias seguras para o seu público-alvo. Neste sentido, a boa imagem do empreendimento estará em evidência no mercado imobiliário.

Por fim, a grande crítica ao legislador fica por conta da faculdade atribuída ao incorporador para instituição do patrimônio de afetação. De acordo com a parte inicial do artigo 31-A da Lei 4.591/64, a submissão do imóvel objeto da incorporação imobiliária ao regime de afetação fica a critério do incorporador. O direito do consumidor, seguramente, estaria mais protegido diante da obrigatoriedade deste recurso, inexistindo argumento em contrário, senão a favor dos construtores, para a opção do legislador. Entretanto, cabe ao potencial adquirente inteirar-se dos seus direitos e garantias e, se possível, optar pelo empreendimento imobiliário que compreenda o patrimônio de afetação.


Referências bibliográficas
FIUZA, Ricardo. Novo Código Civil comentado. São Paulo: Saraiva, 2002.
MEZZARI, Mario Pazutti. Condomínio e Incorporação no Registro de Imóveis. 2. ed. Porto Alegre: Norton Editor, 2002.
PEREIRA, Caio Mário da Silva Pereira. Condomínio e Incorporações. Editora Forense. 10. ed. Rio de Janeiro - RJ, 1999.

Informações Bibliográficas

PETINELLI VIEIRA COUTINHO, Fabrício. Patrimônio de afetação: uma inovação no mercado imobiliário. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, 52, 30/04/2008 [Internet].
Disponívelem http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=2718. Acesso em 25/11/2009.

Postado por Sancho Neto

sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Doação de Imóveis de Pais a Filhos Menores

DOAÇÃO DE IMÓVEIS DE PAIS A FILHOS MENORES

ELVINO SILVA FILHO

(Oficial do Registro de Imóveis da 1.ª Circunscrição de Campinas)

No exame da doação de bens imóveis de pais a filhos menores, a primeira questão que a flora é a de se saber se essa doação necessita ser aceita.

questão não é nova, e já tem sido versada por inúmeros civilistas do mais alto coturno, tanto nacionais como estrangeiros. Mas, pelo interesse prático que desperta, e, pela freqüência com que é versada nos tabelionatos, e algumas vezes nos tribunais, vamos novamente abordá-la.

Se examinarmos a definição legal da doação, veremos ,que a aceitação é um dos requisitos essenciais para que ela se aperfeiçoe e se conclua. Com efeito, diz o legislador no art. 1.165 do 'Código Civil: "Considera-se doação o contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu patrimônio, bens ou vantagens para o de outra, que os aceita."

Seguiu o nosso legislador a orientação das legislações que entenderam a doação como um contrato (C. Civil alemão art. 516; C. Civil português - art. 1.452; C. Civil espanhol art. 618; atual C. Civil italiano - art. 769, etc.), e não a daqueles que a consideram como um ato (C. Civil francês art. 894 e antigo C. Civil italiano - art. 1.050). Sendo um contrato, é indispensável, portanto, o "acordo de vontades" a oferta daquele que doa e a aceitação daquele que recebe a doação (invito beneficium non datur). E, sendo necessária a aceitação para que a doação se complete, indaga-se: como se efetua a aceitação nas doações de imóveis de pais a filhos menores ?

O legislador não exige que a aceitação seja momentânea, na própria escritura, em que os

doadores se despojam de bens de seu patrimônio para enriquecerem o patrimônio de seus filhos. Permite que ela seja feita posteriormente. Mas, a doação só existirá, só se aperfeiçoará com a aceitação do donatário. Antes da aceitação, o que existe é apenas uma proposta, revogável a qualquer tempo, perdendo eficácia com a morte do doador ou do donatário.

Mas, ao doarem bens imóveis aos seus filhos, o que os pais querem e porfiam é que a doação se aperfeiçoe no ato da oferta, na própria escritura. Pergunta-se, então: Os filhos menores poderão aceitar essa doação?

Acesa, e das mais vivas, tem sido a divergência a respeito, tanto doutrinária como

Jurisprudencial.

Entende uma primeira corrente, que os menores impúberes (menores de 16 anos), sendo

absolutamente incapazes não podem manifestar aceitação válida na escritura. Somente os maiores de 16 e menores de 21 anos, relativamente incapazes, poderão nela comparecer e aceitar as doações que lhes fazem os pais. E tiram esse entendimento os autores filiados a esta

corrente, diante do que dispõe o artigo 1.170 do Código Civil. "Às pessoas que não puderem contratar é facultado, não obstante, aceitar doações puras".

CARVALHO SANTOS ao comentar esse artigo alerta o intérprete: "Precisa-se entender

inteligentemente o texto legal. Quando o Código permite que as pessoas que não podem

contratar possam, todavia, aceitar doações puras, sem intervenção dos representantes legais respectivos, compreende-se facilmente a razão disso, que consiste precisamente em ser a doação pura um ato que somente vantagens pode trazer ao beneficiado por ela. Mas, apesar disso, não é possível admitir-se a regra com uma amplitude exagerada, por isso não se compreenderia como fosse a lei tolerar, por exemplo, que um louco ou uma criança de cinco anos pudesse assinar uma escritura, aceitando a doação". (Código Civil Interpretado - 4.a

Edição vol. XVI - Coment. ao art. 1.170, pág. 362).

JOÃO LUIZ ALVES segue a mesma opinião: "Para que o incapaz possa aceitar, diz ele, é preciso que possa manifestar o seu assentimento. Por isso, parece-nos que o texto se refere somente aos relativamente incapazes".

O E. Tribunal de Justiça do nosso Estado seguiu quase que sem discrepância essa orientação.

Nas doações puras de bens imóveis de pais a filhos menores, para que possam se aperfeiçoar e concluir na própria escritura, mister se faz que, aos absolutamente incapazes, seja dado um curador especial para aceitar, por eles, a liberalidade que os seus progenitores lhes fazem, eis que os pais não podem figurar na doação na dupla qualidade de doadores e representantes dos donatários. A nomeação desse curador especial, argumentam, é de rigor, sempre que no exercício do pátrio poder colidirem os interesses dos pais com os dos filhos (art. 387 do Cód. Civil). Sem esse curador especial, nem o Tabelião poderá aceitar a doação pelos menores, como antigamente se fazia, porque o preceito permissivo da aceitação do Tabelião pelos menores, existente nas Ordenações Filipinas (Livro IV - Tít. 63, princ.), não foi reproduzido pelo Código Civil.

Nesse sentido são as decisões uniformes do E. Conselho Superior da Magistratura do Estado proferidas: no Ag. de Petição n. 37.936 da comarca de Bragança Paulista, publicada no D. da Just. de 16-Julho-1948; no acórdão inserto na Rev. dos Trib. Vol. 186/338; no Ag. de Petição n. 61.641 da comarca de Ituverava publicada no D. Just. de 27 de Fevereiro de 1,953 - pág. 3. Seguem também a mesma orientação as decisões das diversas Câmaras Cíveis do Tribunal de Justiça de S. Paulo contidas nos acórdãos publicados na Rev. dos Trib. vol. 180/288 - vol.

195/227 - vol. 232/98 - vol. 254/332.

Levou o nosso E. Tribunal a situações extremas essa sua orientação. Concluiu pela anulação de uma doação feita a um menor que falecera sem aceitá-la, quer por intermédio de um curador especial, quer pessoalmente, uma vez que a morte o colheu antes de ter atingido a idade pela qual, sozinho, pudesse ter manifestado o seu assentimento à liberalidade. Determinou, em conseqüência, a 2.ª Câmara Cível, o cancelamento da transcrição do imóvel efetuada em nome do menor. (Rev. dos Trib. vol. 187/805).

E, firmando cada vez mais esse ponto de vista, de molde a espancar quaisquer dúvidas a

respeito as Câmaras Civis Reunidas desse E. Tribunal, em recurso de revista, por maioria de votos, decidiram: "A aceitação, mesmo nas doações puras não se presume; os que não puderem contratar hão de aceitar o contrato, representados pelo seu tutor com autorização do juiz." (Rev. dos Trib. vol. 208/360).

Entendemos, porém, com a devida vênia, que o E. Tribunal de Justiça não acertou, e,

enveredou pelo pior caminho. A interpretação dada pela Alta Corte da Justiça Paulista ao artigo 1.170 do Código Civil, esposando o pensamento de CARVALHO SANTOS e JOÃO Luiz ALVES, é cerebrina. Não há como se distinguir, nesse dispositivo, os absolutamente incapazes dos relativamente incapazes. O preceito é claro: - "Às pessoas que não puderem contratar" - e aqui não se faz distinção alguma - "é facultado, não obstante, aceitar doações puras".

- Ubi lex non distinguit, nec interpres distinguere debet.

E, se se fizer essa distinção, para se dar um curador especial aos absolutamente incapazes a fim de aceitar as doações puras a eles feitas, o art. 1.170 redundará em uma desnecessidade. Será um dispositivo completamente inútil e supérfluo. Com efeito, de acordo com a regra do artigo 84 do Código 'Civil os incapazes podem participar de todos os atos jurídicos. Se forem absolutamente incapazes serão representados pelos pais, tutores ou curadores, e, se forem relativamente incapazes, participarão pessoalmente dos atos jurídicos, mas serão assistidos por aquelas pessoas. Ora, impor-se a interpretação do art. 1.170 do C. Civil, de acordo com o pensamento daqueles civilistas e da corrente vencedora do E. Tribunal de Justiça, será considerar-se esse dispositivo completamente supérfluo e inútil, porque a situação já estava perfeitamente prevista no artigo 84 do Código Civil. E, não é lícito a qualquer intérprete, dentro de um corpo de leis, e de acordo com os melhores princípios da hermenêutica, considerar um dispositivo legal sem finalidade, com caráter apenas de superfetação. Se o preceito legal existe, é para ter uma finalidade.

Mas, é o caso de se indagar, agora, como aceitarão as doações puras os menores de 16 anos, absolutamente incapazes? Comparecendo ao ato, à escritura, para manifestarem o seu assentimento à liberalidade? Evidentemente, não. Os menores de 16 anos não possuem discernimento suficiente para declararem sozinhos a sua vontade em qualquer ato jurídico, mesmo nas doações puras.

É noção rudimentar que, nos contratos, a aceitação não precisa ser sempre expressa. Há a aceitação tácita ou a presumida, (art. 1.079 do Cód. Civil). E, dentro do próprio capítulo da doação, o legislador nos dá um exemplo de aceitação tácita, ao declarar, no art. 166, que o doador pode fixar prazo ao donatário, para declarar se aceita, ou não a liberalidade. Desde que o donatário, ciente do prazo, não faça dentro nele, a declaração, entender-se-á que aceitou, se a doação não for sujeita a encargo.

Ora, o legislador no artigo 1.170 do C Civil facultando às pessoas que não puderem contratar aceitar doações puras, não quis, à toda evidência, que uma criança de 2 ou 5 anos comparecesse em uma escritura pública e declarasse aceitar a doação. Nem, por outro lado, impôs que, nessas doações, fosse dado ao menor um curador especial, pois a exigência do art. 387 não é de se aplicar às doações puras onde não há qualquer colisão de interesses entre pais e filhos. Determinou, tão só, que os absolutamente incapazes (remissão ao art. 5.º existente no art. 1.170) pudessem aceitar as doações puras, sem impor qualquer formalidade para essa aceitação. É que, essa aceitação, para os menores de 16 anos, é naturalmente tácita.

E, esse é, exatamente, o pensamento e a interpretação cristalina que nos dá o extraordinário jurista CLÓVIS BEVILÁQUA, nestas palavras: "A doação pura é ato essencialmente benéfico, somente proveito leva ao donatário: entende-se aceita, sem a intervenção do representante legal do donatário... E este é o pensamento do nosso art. 1.170. A lei, facultando a aceitação aos incapazes, relativamente a doações puras, quer dizer que essas liberalidades produzem efeito, consideram-se aceitas, desde que o doador as realiza. É o poder social que se manifesta na lei suprindo a incapacidade do donatário, tornando a doação perfeita, não obstante a incapacidade do donatário, e afastando, neste caso, a interferência do representante legal, que somente aparecerá depois, como administrador do patrimônio do incapaz (Código Civil

Comentado - vol. IV - Obsrs. 2.ª ao art. 1.170).

A fonte do art. 1.170 do Código Civil Brasileiro foi inegavelmente o art. 1.478 do Código Civil Português, assim redigido: "As pessoas, que não podem contratar, não podem aceitar, sem autorização das pessoas a quem pertencem concedê-las, doações condicionais ou onerosas.

“Porém, as doações puras e simples, feita a tais pessoas, produzem efeito, independentemente de aceitação, em tudo o que aproveitar aos donatários”. E, esclarece o notável civilista lusitano, CUNHA GONÇALVES: "A doação pura a favor de incapazes nem por isso é ato unilateral como o testamento e não cessa de ser contrato; somente a aceitação dela pelo incapaz ou pelo seu representante legal é subentendida ou presumida pela lei portuguesa, como a presume a lei brasileira, art. 1.166, no caso neste declarado". (Princípios de Direito Civil, - Vol. 2.º, págs. 945/946).

O Supremo Tribunal Federal, em embargos ao recurso extraordinário n. 3.983, de São Paulo, chamado a manifestar-se sobre a questão, declarou, peremptoriamente: "Na faculdade dos incapazes aceitar doações puras, não se distingue entre os absolutamente incapazes dos relativamente incapazes". (Rev. dos Trib. Vol. 191/399).

E, felizmente, o próprio Tribunal de Justiça de São Paulo está mudando de orientação,

começando a se bitolar pelo caminho certo. Na apelação Cível n. 85.248 de Bragança Paulista, a 3.ª Câmara Cível, por votação unânime, assim se manifestou: "Exigir-se aceitação expressa de quem não pode contratar para a validade de ato do qual só benefícios lhe advém, como da doação pura e simples, é, em realidade, faltar à proteção que o estatuto civil tem levantado sobre os privados da razão ou que ainda não se podem dirigir". (Rev. Trib. vol. 277/ pág. 309).

EM CONCLUSÃO, podemos convictamente afirmar: a) - as doações puras e simples de imóveis podem ser efetuadas pelos pais aos seus filhos menores de 16 anos, sem qualquer interferência de curador especial para aceitá-las, pois a aceitação desses menores é naturalmente tácita. O art. 1.170 do Código Civil é de caráter excepcional, pelos próprios termos em que está redigido, e em confronto com o art. 84 do mesmo estatuto legal. Essas doações considerar-se-ão perfeitas e acabadas no momento da celebração da escritura. Os maiores de 16 anos comparecerão pessoalmente no ato para aceitar a liberalidade; a) -

Consideram-se doações puras e simples as que não estão subordinadas a condições, encargos ou vínculos. Ressalte-se, porém, que estão incluídas entre as doações puras as doações feitas pelos pais aos filhos com reserva de usufruto a favor dos doadores (Rev. dos Trib. vol. 103/577; vol 109/668;

vol. 117/136; vol. 118/624; vol. 124/709; vol. 128/182; vol. 178/136; Rev. Forense vol. 68/137; vol. 78/528; vol. 80/156; vol. 126/491). c) - Essas doações puras e simples podem ser transcritas no Registro de Imóveis sem a prova de aceitação de donatário exigida pelo art. 857, n. III do Cód. Civil e § único do art. 233 do Decreto n. 4.857, de 9 de Novembro de 1939 (Reg. Públicos), porque já estão naturalmente aceitas, pela aceitação tácita ou presumida do donatário.

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Conforme a NBR 6023:2000 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto científico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma:

FILHO, ELVINO SILVA. Doação de Imóveis a Filhos Menores. Uma analise sob a norma-da-razão. Biblioteca Digital Medicina Anima, ano 13, n. 2277. 22 Outubro 2009. Disponível em: . Acesso em: 28 Out. 2009.

Arquivo: Cópia e Cola

http://arisp.files.wordpress.com/2008/12/boletim-nov-dez-1960_colaboracao-doacao.pdf


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Postado por Sancho Neto



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terça-feira, 20 de outubro de 2009

Particularidades do registro do contrato de promessa de compra e venda













REVISTA ÂMBITO JURÍDICO ®


Particularidades do registro do contrato de promessa de compra e venda


Diante das diversas incertezas presentes nas relações jurídicas do mundo moderno, é cada vez mais comum a utilização dos contratos preliminares, na impossibilidade da concretização dos contratos definitivos. Este contrato particular de natureza acessória tem como finalidade concluir o contrato principal e este, por sua vez, visa à concretização da prestação pactuada preliminarmente. O contrato de promessa de compra e venda de imóveis é uma espécie de contrato preliminar no qual o promitente vendedor se obriga a outorgar a escritura definitiva de compra e venda com o promitente comprador, no tempo, modo e lugar definidos no instrumento preliminar. A promessa de compra e venda pode ser formalizada com ou sem cláusula de arrependimento. Na primeira hipótese, o promitente comprador, após cumprir todas as exigências pactuadas no contrato tem o direito de exigir do promitente vendedor a concretização do negócio jurídico através da lavratura da escritura definitiva e posterior registro no ofício imobiliário, valendo-se da ação judicial cabível.


Ao receber o contrato de promessa de compra e venda, o oficial de registro de imóveis deve se ater primeiramente a três fatores básicos e fundamentais para a validade do negócio jurídico, previstos no artigo 104 do Código Civil: Agente capaz; objeto lícito, possível, determinado ou determinável; forma prescrita ou não defesa em lei. O agente capaz é o possuidor de capacidade de fato e capacidade de negociação. O objeto lícito possível, determinado ou determinável, de acordo com o ilustre professor Cezar Fiúza é “aquele realizável, tanto materialmente como substancialmente”, ou seja, que não se vincula a coisas impossíveis como a venda de um terreno na Lua, por exemplo, ou a coisas ilegais como a venda de drogas ilícitas e afins. O terceiro requisito para a validade do negócio jurídico (forma prescrita ou não defesa em lei) é o ponto central deste artigo, uma vez que incorre em diversas interpretações em todo o país.

Primeiramente, é necessário se esclarecer que é nulo o negócio jurídico que não possuir a forma prescrita em lei, de acordo com o artigo 166, IV do Código Civil. Pois bem, passemos às questões em debate. De acordo com o artigo 108 do Código Civil: “Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o salário mínimo vigente no País.” Ao se analisar o artigo 1417 do referido diploma legal, conclui-se que o promitente comprador, mediante promessa de compra e venda em que não se pactuou o arrependimento, por instrumento público ou particular, registrada no Cartório de Registro de Imóveis, adquire direito real à aquisição do imóvel. Ou seja, o direito do promitente comprador é um direito real e como tal deveria se enquadrar na definição do artigo 108 acima explicitada. A maioria dos oficiais de registro de imóveis entende que o artigo 1417 do Código Civil tem uma abrangência ampla, podendo ser registrado qualquer contrato de promessa de compra e venda celebrado através de instrumento particular, independentemente de seu valor.

No meu entendimento e no de alguns outros autores, o contrato de promessa de compra e venda sem cláusula de arrependimento somente merece ser registrado sob a forma particular quando versar sobre negócios com valores inferiores a trinta salários mínimos, por expressa disposição legal. Apesar do artigo 462 do Código Civil prescrever que o contrato preliminar deve conter todos os requisitos essenciais ao contrato a ser celebrado, exceto quanto à forma, entendo que a promessa de compra de imóvel é um contrato preliminar atípico, uma vez que gera direito real de aquisição ao promitente comprador quando registrado no ofício imobiliário competente e como tal deve se envolver de uma segurança jurídica maior que os demais.

De acordo com Francisco Amaral : “segurança jurídica significa paz, a ordem e a estabilidade e consiste na certeza de realização do direito. Os sistemas jurídicos devem permitir que cada pessoa possa prever o resultado de seu comportamento, o que ressalta a importância do aspecto formal das normas jurídicas, a sua forma de expressão.

O direito tem, por isso, como um de seus valores fundamentais, para muitos o primeiro na sua escala, a segurança, que consiste, precisamente, na certeza da ordem jurídica e na confiança de sua realização, isto é, no conhecimento dos direitos e deveres estabelecidos e na certeza de seu exercício e cumprimento, e ainda na previsibilidade dos efeitos do comportamento pessoal”.

O negócio jurídico deve sempre se cercar da maior eficácia e presunção de veracidade possível. E nos parece óbvio que ao passar pelo crivo de um tabelião, ou de qualquer outro agente que possua competência para a prática de atos notariais, um contrato de promessa de compra e venda recebe uma espécie de filtragem realizada por um profissional dotado de notável saber jurídico e de fé-pública, e como tal reduz de maneira bastante significativa a possibilidade de fraudes, simulações, dentre outras conseqüências que podem acarretar a nulidade do ato.

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Conforme a NBR 6023:2000 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto científico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma:

Âmbito Juridico. Particularidades do registro do contrato de promessa de compra e venda. Uma análise sob a norma-da-razão. ano 13, n. 2277. 25 Outubro 2009. Disponível em: Âmbito Juridico. Acesso em: Setembro. 2009.

Arquivo: Cópia e Cola

http://www.ambito-juridico.com.br/pdfsGerados/artigos/2721.pdf