sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Dúvida - PMCMV

Edição nº 192/2009 Brasília - DF, terça-feira, 13 de outubro de 2009

Vara de Registros Públicos do DF

EXPEDIENTE DO DIA 06 DE OUTUBRO DE 2009
Juiz de Direito: Ricardo Norio Daitoku
Diretor de Secretaria: Rodrigo Teixeira Marrara
Para conhecimento das Partes e devidas Intimações

DECISÃO

Nº 138917-9/09 - Duvida - A: OFICIAL DO 4 OFICIO REGISTRO DE IMOVEIS DO DF. Adv(s).: DF9999999 - Sem Informacao Advogado.
R: ILHAS MAURICIO EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS SA. Adv(s).: Sem Informação de Advogado. Cuida-se de procedimento administrativo instaurado em razão de dúvida suscitada pelo Oficial do 4º Registro de Imóveis do Distrito Federal questionando o real alcance do § 1º do art. 237-A da Lei n. 6.015/73, introduzida pelo art. 76 da Lei n. 11.977/09.Para tanto, alega que Real Ilhas Maurício Engenharia Ltda, invocando referido dispositivo legal, pretende recolher a título de emolumentos a quantia de R$ 355,77 para o registro de 78 contratos particulares de mútuo para construção de empreendimentos imobiliários quando o correto, em sua visão, seria o valor de R$ 27.750,06, ao argumento de que tal benefício não se aplicaria aos empreendimentos que não sejam os do Programa Minha Casa, Minha Vida.Não sendo conhecido o pedido como dúvida, requer, alternativamente, seja recebido o expediente como peça para instauração de procedimento administrativo em caráter normativo.Instado a se manifestar, o Ministério Público oficiou pelo conhecimento do pedido como consulta e que seja expedida instrução normativa com a orientação de se aplicar o art. 237-A e parágrafos, da Lei n. 6.015/73, indistintamente a qualquer incorporação imobiliária, sendo ela, ou não, oriunda do Programa Minha Casa, Minha Vida.É o relatório. Decido.A questão a ser examinada em nada se confunde com a dúvida registrária prevista no art. 198 da Lei n. 6.015/73, já que, na espécie, não se visualiza inconformismo por parte do apresentante do título em relação a eventual exigência formulada pelo ilustre Registrador.Assim, acolhendo o substancioso parecer ministerial, analiso o expediente como mera consulta. Pois bem.
Antes de tudo, convém registrar que a Lei n. 11.977/09, ao contrário do que sugere o consulente, não dispõe apenas sobre o Programa Minha Casa, Minha Vida. Tal conclusão decorre da simples leitura da ementa da referida lei. Confiram:"Dispõe sobre o Programa Minha Casa, Minha Vida - PMCMV e a regularização fundiária de assentamentos localizados em áreas urbanas; altera o Decreto-Lei no 3.365, de 21 de junho de 1941, as Leis nos 4.380, de 21 de agosto de 1964, 6.015, de 31 de dezembro de 1973, 8.036, de 11 de maio de 1990, e 10.257, de 10 de julho de 2001, e a Medida Provisória no 2.197-43, de 24 de agosto de 2001; e dá outras providências."A ementa das leis, de acordo com o art. 5º da Lei Complementar n. 95/98, destina-se a explicitar, de modo conciso e sob a forma de título, o seu objeto.Nada obstante, isso nem sempre é observado pelo legislador. A falta de rigor técnico na elaboração da Lei n. 11.977/09 se vê já na parte preliminar, pois a concisão empregada na ementa suprimiu um de seus objetos, qual seja, a obrigatoriedade de implementação do registro eletrônico nos serviços de registros públicos. Com efeito, a Lei n. 11.977/09 está estruturada em quatro capítulos, sendo que apenas a primeira destina-se ao referido Programa Minha Casa, Minha Vida. O segundo capítulo trata especificamente sobre o registro eletrônico, as custas e os emolumentos dos serviços de registros públicos. O terceiro define conceitos e traz regras e procedimentos para regularização fundiária de assentamentos urbanos. E, por fim, o quarto e último capítulo, que nos interessa em particular, alterou algumas legislações, dentre elas a Lei dos Registros Públicos. In casu, a atecnia legislativa
ultrapassou a simples ementa, pois, não se tratando de codificação, o melhor seria dispor de objetos distintos em leis igualmente distintas, como, aliás, recomenda o § 1º do art. 7ª da Lei Complementar n. 95/98.De todo modo, a aplicação da lei em comento reclama uma interpretação lógica, a fim de "apurar o sentido e a finalidade da norma, a intenção do legislador, por meio de raciocínios lógicos, com abandono dos elementos puramente verbais. O intérprete procura extrair as várias interpretações possíveis, eliminando as que possam parecer absurdas e que levem a um resultado contraditório em relação a outros preceitos, para descobrir a razão de ser das leis." Tendo isso em mente, observa-se que a Lei n. 11.977/09 quando quis distinguir o beneficiário assim o fez, como se vê como nos seguintes exemplos:"Art. 42. As custas e os emolumentos devidos pelos atos de abertura de matrícula, registro de incorporação, parcelamento do solo, averbação de construção, instituição de condomínio, registro da carta de habite-se e demais atos referentes à construção de empreendimentos no âmbito do PMCMV serão reduzidos em: I - 90% (noventa por cento) para a construção de unidades habitacionais de até R$ 60.000,00 (sessenta mil reais); II - 80% (oitenta por cento) para a construção de unidades habitacionais de R$ 60.000,01 (sessenta mil reais e um centavo) a R$ 80.000,00 (oitenta mil reais); e III - 75% (setenta e cinco por cento) para a construção de unidades habitacionais de R$ 80.000,01 (oitenta mil reais e um centavo) a R$ 130.000,00 (cento e trinta mil reais)." "Art. 43. Não serão devidas custas e emolumentos referentes a escritura pública, quando esta for exigida, ao registro da alienação de imóvel e de correspondentes garantias reais, e aos demais atos relativos ao primeiro imóvel residencial adquirido ou financiado pelo beneficiário com renda familiar mensal de até 3 (três) salários mínimos. Parágrafo único. As custas e emolumentos de que trata o caput, no âmbito do PMCMV, serão reduzidos em: I - 80% (oitenta por cento), quando os imóveis residenciais forem destinados a beneficiário com renda familiar mensal superior a 6 (seis) e até 10 (dez) salários mínimos; e II - 90% (noventa por cento), quando os imóveis residenciais forem destinados a beneficiário com renda familiar mensal superior a 3 (três) e igual ou inferior a 6 (seis) salários mínimos."Ora, a Lei n. 11.977/09, além de tratar do programa destinado a famílias de baixa ou média renda, cuidou também da regularização fundiária de interesse específico, que ocorre justamente quando não estiver caracterizado o interesse social. Confiram:"Art. 47. Para efeitos da regularização fundiária de assentamentos urbanos, consideram-se:
(omissis)VII - regularização fundiária de interesse social: regularização fundiária de assentamentos irregulares ocupados, predominantemente, por população de baixa renda, nos casos: a) em que tenham sido preenchidos os requisitos para usucapião ou concessão de uso especial para fins de moradia; b) de imóveis situados em ZEIS; ou c) de áreas da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios declaradas de interesse para implantação de projetos de regularização fundiária de interesse social; VIII - regularização fundiária de interesse específico:
regularização fundiária quando não caracterizado o interesse social nos termos do inciso VII." Vê-se, pois, que a lei procura, indistintamente, a regularização fundiária da população, não distinguindo se ela é de baixa renda ou não. Nesse diapasão, tenho por equivocado o entendimento esposado no precedente da Corregedoria-Geral de Justiça do Rio de Janeiro, pois fundado na falsa premissa de que a Lei n. 11.977/09 trataria somente "da situação específica das pessoas que se enquadram no perfil dos beneficiários do Programa Minha Casa, Minha Vida". De outro giro, assiste razão ao douto órgão ministerial quando afirma que a "interpretação deve ser a mais favorável à redução de custos para os apresentantes dos títulos".Na interpretação das leis, toda construção legislativa deve ser favorável ao cidadão. Nem se alegue que o interessado aqui é pessoa jurídica e não pessoa física, pois se a lei não distingue não cabe ao intérprete distinguir. Aliás, não são poucas as leis que segue a lógica da
menor onerosidade. Com efeito, no Código Civil temos:"Art. 423. Quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente.""Art. 819. A fiança dar-se-á por escrito, e não admite interpretação
extensiva."No Código Tributário Nacional:"Art. 111. Interpreta-se literalmente a legislação tributária que disponha sobre:I - suspensão ou exclusão do crédito tributário;II - outorga de isenção;III - dispensa do cumprimento de obrigações tributárias acessórias.""Art. 112. A lei tributária que define infrações, ou lhe comina penalidades, interpreta-se da maneira mais favorável o acusado, em caso de dúvida quanto:I - à capitulação legal do fato;II - à natureza ou às circunstâncias materiais do fato, ou à natureza ou extensão dos seus efeitos;III - à autoria, imputabilidade, ou punibilidade;IV - à natureza da penalidade aplicável, ou à sua graduação."No Código de Processo Civil:"Art. 620. Quando por vários meios o credor puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o devedor."No Código de Defesa do Consumidor:"Art. 47. As cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor."Portanto, não vejo razão para ser diferente aqui só por se tratar de uma construtora.A matéria em discussão é idêntica à que foi submetida a este Juízo nos autos n° 131377-5/09. Assim, da mesma forma como decidido no referido processo, determino o envio dos autos à Corregedoria do eg. Tribunal de Justiça do Distrito Federal para conhecimento.

Postado por Sancho Neto

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